Capítulo 4: Problemas em Dolce Island – Parte 1


Problemas em Dolce Island – Parte 1


“Já faz três dias que estamos aqui e ela nem pensou em acordar. Às vezes faz algum movimento, mas nada além disso, continua ali, imóvel, dormindo eu acho. Fico pensando no que aconteceu na Teakwood Forest, desde o comportamento estranho do Charmeleon até o aparecimento do Celebi e a atitude suicida dela, mas por que fez isso? Por que foi atrás de mim e me ajudou? Por que se arriscou? E de quem eles estavam falando? Quem é você, Ellie... é mesmo, ainda não sei seu sobrenome.”

- É difícil te ver pensando tanto assim. – disse um senhor ao entrar no quarto onde Richard estava, chamando sua atenção. Ele estava ao lado de Ellie, observando-a, enquanto ela dormia profundamente.

- É que é tão estranho ela não ter acordado ainda...

- Já te disse o porque. Ela estava com um desgaste físico, e talvez psicológico imenso, parecia que não dormia ou comia direito há meses, ficava só nessa rotina de fuga, já que você me disse que eles a conheciam.

- Era o que parecia.

- Então espere rapaz, dê tempo ao tempo, eu estou cuidando muito bem dela... e de você também.

- Eu sei velho, e já te agradeci por isso. Mas eu queria perguntar para ela o porquê de ter feito aquilo, o porquê de ter me ajudado.

- Você ainda não aprendeu, não é mesmo? Não é só porque se deu as costas ao mundo que ele vai fazer o mesmo, pelo menos não todo ele.

O garoto ouvia tudo ficando cada vez mais pensativo, olhando pela janela do quarto de onde via a chuva que ainda caía na praia. A casa onde estavam era tão simples como seu dono: toda de madeira, tendo só um quarto e uma sala; a cozinha era improvisada, os poucos móveis eram simples, de madeira também. Flay aquecia-se no colo de seu dono e o Togetic dela repousava ao lado da cama, tendo dormido apos observá-la preocupado por horas, só esperando-a acordar.



Red e Blue Eyes agora estavam diante de uma sinistra silhueta, na mesma sala pouco iluminada de antes, só que nenhum deles aparentava medo.

- O que foi? – perguntou Blue com descaso.

- Você sabe muito bem o que houve... Eles fugiram, de novo! – gritou o homem, batendo as mãos sobre a mesa em sua frente – Nem vocês conseguiram dar conta de pirralhos!

- E você queria que eu fizesse o quê? – retrucou Red – Eu não contava com a aparição de Celebi. Mas, para sua informação, algumas de suas suspeitas foram confirmadas.

- É mesmo? Quais?

Antes que ele pudesse responder, alguém abre as portas com força. Por elas entrou rapidamente um homem já de cabelos brancos, mas não aparentava ser tão velho. Suas roupas eram sobrepostas a um longo jaleco branco e tinha um grande bigode.

- Onde ela está, fale! – ordenava o homem erguendo Red pelo colarinho.

- E-eu não sei! – respondeu assustado.

- O que você fez com ela?

- Ela fugiu...

- Ponha-o no chão, é uma ordem! – ordenou o comandante, levantando-se.

- Você não manda em mim!

- Ah, mando sim, ou você se esqueceu de que foi rebaixado? – retrucou, fazendo o homem soltar Red – Por que não volta para sua pesquisa, que, aliás, é a melhor coisa que você faz? Nós precisamos do projeto pronto o mais rápido possível.

- Eu juro, se vocês fizerem alguma cosa com ela... não serei responsável pelos meus atos!



Já era noite e a chuva caia mais forte agora, sendo possível ouvir os estrondos dos trovões. “Nossa, não vai mais parar de chover?” dizia Richard a si mesmo. O garoto estava deitado no chão da sala, em uma cama improvisada enquanto o velho senhor dormia no único sofá da casa. Ele não conseguia dormir, pensava em muitas coisas, agora mais no que Lucas e Amanda tinham falado sobre a vingança de seus pais e o porquê daquele livro que ele pegou ser tão importante. Estava quase pegando no sono quando ouviu algo vindo do quarto:

- Parem!!!

Ao reconhece a voz, correu depressa ao quarto onde Ellie estava e a viu sentada no meio da cama, pressionando a cabeça com força e chorando assustada. Togetic voava assustado, tanto com o grito quanto por ver o estado de sua dona.

- Ellie, o que aconteceu?

- E-eles vão me pegar...

- Eles quem? – dizia olhando ao redor, procurando por alguém, mas não encontrou nada – O que está acontecendo com você?

Ele perguntou colocando sua mão no ombro dela, que reagiu ao toque, olhando e agarrando-o com força.

- Por favor, não deixe eles me levarem. – dizia chorando, com medo, o deixando sem reação.

- E-eu, eu... – gaguejava.

“Será que está acontecendo de novo?” pensou, mas virou-se ao sentir algo lhe tocar as costas: seu Flareon o empurrava, e o velho senhor estava atrás dele, observando-o. Flay conseguia dizer o que queria só com seu olhar: “Vai lá, acalme-a!”. Então, timidamente, colocou seus braços ao redor do corpo dela e pressionou contra o seu; conseguia sentir seu desespero pelo quanto tremia: “O que será que a assustou tanto?”.

- Por favor, não deixa... – dizia baixinho, deixando-se ser acolhida pelo abraço Richard.

-Eu... não vou deixar, prometo!

Algum tempo depois, Ellie já estava um pouco mais calma, sentada na ponta da cama agarrada ao braço de Richard, apoiando sua cabeça em seu ombro. Seu corpo ainda tremia e eu olhar triste fitava o chão do quarto.

- Trouxe chá quentinho para vocês. – falava o senhor.

- Obrigada, mas quem é você, e onde eu estou? – perguntava ela observando o lugar.

- Oh, que falta de educação da minha parte, meu nome é Booker. – dizia o senhor moreno que vestia simples e coloridas roupas, tendo as costas meio curvadas e poucos cabelos brancos por causa do tempo – E vocês estão em minha cabana em Dolce Island.

- Dolce Island?! – perguntou surpresa.

Dolce Island é uma das menores ilhas da região, sendo só habitada por vários Pokémon e, de vez em quando, por Booker.

- Sim, por quê? – perguntou o senhor curioso.

- N-nada, é que... este lugar me faz lembrar de coisas que custei a esquecer. – disse ela, fazendo o silêncio reinar ali, até Richard quebrá-lo.

- Conheço Booker há muitos anos, é um dos poucos que eu posso chamar de amigo. Foi ele quem me ajudou quando eu estava no orfanato.

- Mas o que aconteceu? – perguntava meio confusa.

- Essa é uma boa pergunta – respondeu o garoto – mas eu também tenho algumas perguntas... Você me deve algumas explicações: Quem realmente é você? Por que veio atrás de mim? Por que aqueles caras estão atrás de você? O que...

- Epa, espera um pouco tá? – interrompeu ela, levantando-se e indo em direção a janela, vendo a forte chuva que caía – Você não sabe fazer uma pergunta de cada vez?

- Eu já falei isso, mas ele nunca me deu atenção. – disse Booker sem graça.

- Ah, qual é velho? Vai voltar a pegar no meu pé agora? – retrucou ele, fazendo Ellie se assustar com aquela arrogância.

- Não se preocupe querida – interveio o senhor – ele é assim mesmo. O dia em que ele respeitar mesmo alguém é porque esse alguém é muito especial.

- Mas... o que realmente aconteceu? Não me lembro de muita coisa, sei que eles estavam atrás de mim – hesitou, respirando fundo – de novo!

- Isso eu descobri, mesmo ainda não sabendo o porque. – retrucou o garoto, calando-se comum sinal de Booker.

- Mas então eu... senti algo, algo diferente, e então apareceu... Celebi! – falou surpresa a si mesma – Ele está bem? Não pegaram ele, pegaram?

- Como quer que eu responda a suas perguntas se você não responde as minhas? – perguntou ele encarando-a.

- É que, desta vez, não posso responder a todas elas...

- Por quê?

- Par seu próprio bem, não posso.

- Mas nenhuma mesmo? – insistia.

- Talvez... não sei, depende.

- Então tá: quem realmente é você?

- Oras, não sabe ainda? Meu nome é Ellie, prazer. – ironizava.

- Não, não, quero saber quantos anos você tem, de onde veio...

- Então agora é um interrogatório? – perguntou nervosa.

- E se for? – falou encarando-a – Como quer que eu te ajude se nem te conheço?

- A única coisa de que você vai saber é que tenho 15 anos, se bem que não sei para que isso vá lhe servir. – respondeu friamente – Mais alguma pergunta?

Os dois agora estavam próximos, um de frente para o outro, encarando-se com raiva.

- Sem brigas, por favor! – dizia Booker tentando acalmá-los.

- Bom, se quer mais perguntas, lá vai! – se impôs Richard – Por que veio atrás de mim, e aqueles caras atrás de você?

- Bem... – disfarçou – é complicado. Eu sabia que eles acabariam vindo atrás de você...

- Como me achou?

- Não foi difícil, você é mais conhecido do que pensa.

- Mas como soube que viriam atrás de mim? – perguntava cada vez mais confuso.

- Eu... os ouvi comentando.

- Onde? – perguntou surpreso.

- É que... eu acabei ouvindo sem querer... – tentava se explicar – quando eu estava fugindo...  eles estavam atrás de mim, por causa disto. – terminou mostrando-lhes o cordão que carregava no pescoço. Em sua ponta era possível ver algo extremamente parecido com um pokéball, porém menor e de cor diferente, sendo essa negra com detalhes vermelhos e dourados.

- E o que exatamente é isso aí?

- Ha, mas isso eu não vou falar mesmo!

- Caramba, você consegue ser mais irritante do que estranha, ainda mais quando seus olhos brilharam ou sei lá o quê. – bravejava alto.

Ao ouvir isso, Ellie ficou paralisada com as duras palavras do garoto, ficando surpresa e um tanto envergonhada, e Richard percebeu o que fizera.

- Me desculpe, eu não...

- Me deixe em paz! – interrompeu-o, saindo correndo do quarto e sumindo de vista pela porta da cabana.

Ele agora fitava a porta aberta, vendo que a chuva estava diminuindo. Togetic voava e bravejava, gritando para o garoto e apontando por onde a garota saira.

- Droga... – suspirou – acho que fiz besteira.

- Você tem que aprender a ser mais gentil, ela não é um de seus Pokémon, é uma garota... muito bonita, só para avisar. – completou Booker, provocando o garoto.

- Não enche, velhote! – bravejava novamente – Mas o que eu faço? Ela tentou me ajudar, ou sei lá o quê... e que ninguém faz isso por mim, há muito tempo. – suspirou triste.

- Vá pedir desculpas, oras. – dizia, como se isso fosse a coisa mais simples do mundo.

- Até parece que ela vai querer me ver agora, está pior que um Ursaring!

- Esse é o seu problema, você é muito negativo; o que foi que eu disse sobre dar as costas para todos e ele não fazer o mesmo? Vá, tente pedir desculpas... e leve o Flay com você.

- Flare?! – disse o Pokémon surpreso.

- Eu e você sabemos que Richard não sabe e não vai conseguir fazer isso sozinho, e além do mais, você não vai dizer nada mesmo. – propôs Booker, fazendo o Pokémon rir.

- Como você gosta de levanta minha moral... – retrucou irônico.

Vendo que não tinha escolha, saiu da cabana à procura de Ellie, acompanhado por Flay. Depois de muito tempo procurando, vê alguém escondido atrás de uma grande rocha de onde era possível ver o lindo amanhecer, já que finalmente parara de chover. Aproximando-se pode ver que era ela, que fitava o horizonte. Seu semblante era triste e seus olhos estavam úmidos, sua roupa estava pouco molhada, “Talvez tenha pegado um pouco da chuva...”, seu rosto estava vermelho, provavelmente depois de tanto chorar. Aproximou-se com cautela, tinha medo de sua reação, mas surpreendeu-se ao perceber que ela já sabia de sua presença:

- Você não faz idéia de como isso é difícil para mim.

- Como? – perguntou cauteloso.

- Ter isso com você, ser assim... diferente, mas não saber o quanto! Foi assim quando eu era pequena, e ainda é, até hoje.

- Assim como?

- Quando os que estavam próximos de mim descobriam que...eu não era igual aos outros – dizia meio constrangida – não sei por que, mas se afastavam de mim, às vezes até por medo, pode?

- Puxa, me desculpe, eu não sabia.

- Se você está se desculpando por você, até penso em aceitar suas desculpas, mas se é por mim, pode retirar o que disse!

- Por quê?

- Não me culpo por ser assim, então não quero que sintam pena de mim, mas – dizia com a voz trêmula – eu queria entender por que as pessoas se afastam de mim, por que eu sou assim... Por acaso eu represento algum perigo?

- Você talvez não, mas já os que estão no seu pé... – disse fazendo graça, sentando-se ao seu lado, fazendo-a rir, mas que logo foi substituído pelo seu triste semblante.

 - Olhe só, estou rindo da última pessoa que eu queria ver no mundo. – ironizou, acariciando Flay, que deitara ao seu lado, fazendo-lhe carinho.

- Valeu mesmo. – retrucou – Mas será que eu poderia saber o que realmente acontece quando... – hesitou em continuar.

- Meus olhos brilham? – completou.

- Isso, porque você me deu um baita susto, sabia?

- Desculpe, é que não controlo isso, nem sei o que é. Não tem dia, hora ou lugar para acontecer, mas quando acontece, vejo imagens, de coisas que estão perto ou longe, que eu conheço ou não, que já aconteceram, ou que vão acontecer...

Ao ouvir isso, Richard ficou estático, parecia não conseguir acreditar. Sendo verdade ou não, as coisas pareciam fazer sentido, as poucas peças desse quebra-cabeça se encaixavam com perfeição.

- Na verdade, foi meio que com isso que te achei, mas isso não importa agora.

- Por quê?

- Porque tudo vai voltar ao normal, ou ao meu normal. Vou ficar sozinha de novo, e cada um segue para um lado diferente.

- E por que você acha isso?

- Do jeito que você falou comigo na cabana, não duvido do óbvio. – terminou, ameaçando levantar, mas sendo segurada pelo braço por Richard.

- Você se esqueceu do que combinamos? Eu te ajudo, você me ajuda, esse era o trato, não importando o que acontecesse.

- S-sério? – dizia um tanto surpresa.

- Sim, muito sério. – disse levantando-se também.

- Então pode me prometer uma coisa? – disse um tanto tímida.

- O que?

- Que não vai mudar de decisão no meio do caminho, e que não vai contar isso a ninguém, nunca.

- Tá, tudo bem, mas isso são duas promessas. – brincou.

- Seu besta. – respondeu empurrando-o, agora com um leve sorriso no rosto.

- Se vocês quiserem, podem ficar comigo por algum tempo. – falou Booker, assustando-os.

- Mas você gosta de fazer isso, não é, velho? – dizia o garoto irritado.

O senhor riu, mas Ellie agora prestava atenção em outra coisa, virando-se de costas ao mar, atenta a cada som. O garoto percebeu sua atitude, olhou na mesma direção que ela, mas não entendia o que ela tanto observava:

- O que ouve, Ellie?

- Quieto! – sussurrou.

- Mas o que foi? – perguntou, sussurrando também.

- Você consegue ouvir?

- Ouvir o que? Não ouço nada!

- Exatamente.

- Mas isso é uma ilha desabitada, não ouvir nada é meio normal, não é?

- Não é uma questão de ouvir, e sim de escutar! – falou deixando-o mais confuso ainda – Esse silêncio, mas também esses sons... São eles! – disse paralisando de medo.

- Eles quem? – perguntou, mas sem retorno – “Será que está acontecendo, de novo?!”

A atenção de todos ali foi chamada para a mata, onde se pôde ouvir uma explosão. Enquanto Richard e Booker olhavam perplexos para a fumaça que subia em meio às árvores, Ellie começou a correr na direção oposta a do ocorrido, sendo seguida depois pelos outros.

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